Dor na ponta do dedo, sem causa definida? A dor piora em temperaturas baixas? Cuidado, você pode possuir um tumor glômico

Dr. Leonardo Kurebayashi • February 22, 2023

O que são?


São lesões tumorais benignas que envolvem células que controlam a termorregulação e fluxo sanguíneo microvascular local. Os tumores glômicos chegam a representar 5% de todos os tumores na mão. Podem estar localizados em qualquer lugar do corpo mas, nas mãos, costumam se apresentar na região subungueal. Essa apresentação abaixo da unha é a mais prevalente, totalizando 50% dos casos de tumores glômicos nas mãos (Green's 8th ed). Em 1972, Carroll et al. descreveram que, devido à alta concentração de corpos glômicos na região subungueal, 75 a 90% dos tumores glômicos surgiram nessa localização.


A primeira descrição dessa lesão foi feita em 1812 por William Wood, descrevendo-a como um tubérculo subcutâneo doloroso.

Principais queixas, sinais e sintomas


Em 1996, VanGeertruyden
et al. publicaram um trabalho envolvendo 51 pacientes e as estatísticas quanto aos sinais e sintomas foram as seguintes:


  1. 100% dos pacientes apresentaram extrema sensibilidade ao tocar o tumor
  2. 80% apresentaram dor espontânea
  3. 63% apresentaram sensibilidade ao frio
  4. 33% apresentaram nódulo volar na polpa digital ou deformidade na unha
  5. 29% apresentaram descoloração azulada abaixo da unha

Tumor glômico na topografia identificada pela seta preta evidenciando descoloração azulada abaixo da unha.

O tumor glômico pode ser terrivelmente doloroso, principalmente se realizada pressão sobre o local do tumor. Também podem apresentar uma sensibilidade extrema ao frio



Muitos dos pacientes se queixam de dor ao lavar as mãos em água gelada, manipular alimentos congelados ou retirar os mesmos do freezer. 


Netscher
et al. (2012) descreveram 4 testes a serem realizados durante o exame físico:


  1. Teste de Love - Ao aplicar pressão no local suspeito com a cabeça de um alfinete, o paciente refere dor intensa;
  2. Teste de Hildreth - Redução da dor ou da sensibilidade durante o teste de Love ao se realizar uma isquemia transitória com um torniquete. Após a pressão ser rapidamente liberada do manguito, o paciente refere intensificação da dor;
  3. Teste de frio ("cold test") - Dor no local ao aplicar água gelada ou um cubo de gelo no local suspeito;
  4. Teste de Joseph-Posner - Dor ao aplicar spray de álcool etílico devido à redução da temperatura local;



Exames de imagem que complementam a avaliação


O principal exame de imagem solicitado pelo cirurgião de mão é a
Ressonância Magnética com contraste, apesar de que, dependendo do tamanho da lesão e o tipo de equipamento utilizado, o exame pode se mostrar negativo.  Em um estudo publicado em 2005 (Al-Qattan et al.) envolvendo 42 pacientes, a sensibilidade da ressonância magnética se mostrou de 90%, com valor preditivo positivo de 97%. Entretanto, a especificidade foi de apenas 50%.


Exemplo de laudo de Ressonância Magnética descrevendo o padrão do tumor que sugere tumor glômico associado a remodelamento ósseo da falange distal

Em um estudo publicado por Chen SH et al. (2002), a ultrassonografia foi utilizada para localização do tumor glômico em 34 pacientes. O exame evidenciava nodulações hipoecóicas com hipervascularização entre a cortical dorsal da falange e o leito ungueal em todos os casos.


Os autores defendem que, além do menor custo para realização, a ultrassonografia consegue descrever com precisão o tamanho, localização, formato do tumor, além de dizer se o mesmo é palpável.

Tratamento


O tratamento consiste em
remoção da unha, identificação do tumor glômico,  excisão cirúrgica do mesmo e reposicionamento da unha. Nos casos em que a lesão é fora do leito ungueal, não necessariamente há necessidade da remoção da unha.


É realizada uma incisão longitudinal sobre o leito ungueal, diretamente sobre o tumor e o mesmo é dissecado dos tecidos adjacentes. É comum, nesse momento, o tumor se projetar para fora da incisão. Após ressecção do tumor, o leito ungueal é fechado com sutura primária e a unha é reposicionada.

Em alguns casos, há necessidade de confecção de um "flap" do eponíquio para exposição completa da tumoração. A topografia da lesão é que definirá o tipo de incisão a ser realizada, por isso o exame físico minucioso é fundamental para o correto planejamento cirúrgico.

Complicações


O paciente deve estar ciente das possíveis complicações cirúrgicas: deformidade da unha, síndrome da dor complexa regional (algodistrofia ou distrofia de Sudeck), infecção local e a principal delas, a
recorrência tumoral. Alguns autores descrevem as taxas de recorrência variando de 4 a 15% mas já foram descritos estudos com cerca de 20% de recorrência (Netscher et al., 2012).


A incidência de múltiplas lesões sincrônicas é reportada em 25% dos casos
, sendo necessária avaliação minuciosa no período pré-operatório e durante o procedimento cirúrgico. 


Devido à alta taxa de recorrência e das altas taxas de possíveis lesões sincrônicas, se os sintomas persistirem por mais de 3 meses após a ressecção cirúrgica, é recomendado repetir os exames de imagem e considerar fortemente a re-exploração cirúrgica.


Conclusão


Todo paciente deve ser avaliado individualmente e a forma de tratamento será ajustada de forma personalizada. Consulte seu especialista de cirurgia de mão para o diagnóstico preciso e conduta acertada.

Referências bibliográficas


  1. Wolfe SW, Hotchkiss RN, Pederson WC, Kozin SH, Cohen MS, Green's Operative Hand Surgery, 8th ed. Elsevier, 2022
  2. Carroll RE, Berman AT. Glomus tumors of the hand: review of the literature and report on twenty-eight cases. J Bone Joint Surg Am. 1972 Jun;54(4):691-703.
  3. Wood W. On Painful Subcutaneous Tubercle. Edinb Med Surg J. 1812 Jul 1;8(31):283-191.
  4. Van Geertruyden J, Lorea P, Goldschmidt D, de Fontaine S, Schuind F, Kinnen L, Ledoux P, Moermans JP. Glomus tumours of the hand. A retrospective study of 51 cases. J Hand Surg Br. 1996 Apr;21(2):257-60.
  5. Netscher DT, Aburto J, Koepplinger M. Subungueal glomus tumor. J Hand Surg Am. 2012 Apr;37(4):821-3
  6. Al-Qattan MM, Al-Namla A, Al-Thunayan A, Al-Subhi F, El-Shayeb AF. Magnetic resonance imaging in the diagnosis of glomus tumours of the hand. J Hand Surg Br. 2005 Oct;30(5):535-40.
  7. Chen SH, Chen YL, Cheng MH, Yeow KM, Chen HC, Wei FC. The use of ultrasonography in preoperative localization of digital glomus tumors. Plast Reconstr Surg. 2003 Jul; 112(1):115-9; discussion 120.


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